Thursday, January 12, 2012

Página 2

(escrever para você é respirar)

ESTOU EM SUAS MÃOS e você em cada palavra. Não se assuste meu amor, o amor não mata: só machuca e decepciona um pouco, às vezes, e aos poucos. Mas sempre se supera e, mesmo quando morre ou parece perder fôlego, e mesmo quando chora ou parece sorrir loucamente, e mesmo quando implora ou se esquece de pedir um pouco de atenção: ele acaba recomeçando. Por isso é e será sempre vital, assim como escrever. Eu escrevo porque preciso dividir com alguém tudo o que explode em mim: o amor, a saudade e você.  Preciso da companhia dos seus olhos grandes e quase negros para ler a solidão dos meus poemas curtos e quase cegos. Preciso da maestria da sua sensibilidade para interpretar sobriamente a insegurança dos meus desejos confusos. Preciso também da sabedoria da sua fala tão delicada – quando diz que está vivendo de saudade – para entender o trauma por trás dos meus silêncios incompreensíveis. Enfim: preciso de você. E é por isso que eu escrevo. E é por isso que estou em suas mãos. E é por isso que você está em cada palavra.

Escrevo também para saber como foi o seu dia – se você chorou esta manhã, se você acordou um pouco mais tarde do que o costume ou se, mais cedo, fumou um maço inteiro tentando se acalmar e esquecer por um breve momento as confissões e as confusões do seu mundo, como de costume. Escrevo também para saber como foi a sua noite – se você conseguiu dormir e sonhar e me ver, por pouco tempo que seja, nessas imagens pensadas, nessas imagens prensadas e intocáveis, tocadas apenas pela capacidade de sonhar, mas que ao despertarem serão apenas o que são: lembranças sonhadas. Escrevo também para saber quais são os seus medos e a quem você assusta, quais são os seus desejos e por quem você se ajoelha, quais são suas verdades e a quem você se permite mentir. E, como se não bastasse, escrevo também para saber se você me encaixa no seu tempo, mesmo sabendo que o amor é um temporal atemporal que faz chover e tremer e molhar e, mesmo assim, os esperançosos amantes conseguem enxergar – talvez pela cegueira momentânea das pequenas paixões, talvez pela esperança eterna de um dia acordarem ao lado de um grande amor – um sol quente e amarelo e belo, e denso, imenso.

Escrever para você é respirar, se tornou vital. É meu jeito distante de te ter sempre por perto, sempre por dentro. Mas acredite: eu trocaria, sem sonhar duas vezes, cada palavra já escrita, cada sonho já sonhado e cada silêncio já quebrado, pela sua presença constante, meu amor. Não há mais como esconder o que sinto quando te vejo desfilar pelo meu mundo todas as manhãs como se fosse voar e alcançar um céu límpido – daqueles que não existem mais: sem nuvens, sem vento, sem pássaros, sem deuses para atrapalhar a delicadeza tão humana do seu voo. Não há mais como esconder todas as verdades que eu preciso dizer, aos prantos, aos seus ouvidos e as que eu preciso ouvir, aos tantos, dos seus lábios finos, que ainda preservam tantas palavras não ditas, como se quisessem me poupar de um possível sofrimento; e por isso se calam.

A única dor que você me causa é a dor sufocante e física da saudade. É inevitável. Todos os dias, frios ou não; todas as noites, em claro ou não; em cada minuto, diminuto ou não, você se faz presente, querendo ou não, como um grito gritado aos prantos e aos tantos e aos quatro cantos do meu mundo – que, entretanto, também se tornou um pouco seu. E eu me pego sorrindo, feito bobo. E eu me apego tanto a essa risada, feito louco. E eu me apago num sono profundo, feito poucos. Mas aquela dor sufocante e física da saudade continua lá. Aliás, aqui. E é exatamente aqui que ela segue o seu destino de fazer doer e faz questão de me lembrar todas as noites e com todas as letras e com todas as dores e com todas as cores: que você não é minha. Que você não é minha por enquanto: alívio, esperança. Que um dia, quem sabe, eu poderei contemplar a beleza do seu sorriso todas as manhãs e me alimentar da poesia dos seus olhos grandes e quase negros sempre que acariciar seus cabelos sem te perder de vista. E assim te olhar todas as noites em claro e acreditar claramente que em algum momento ou por algum motivo eu vou estar nesse sonho, desperto e de olhos bem abertos. E é também por isso que eu te escrevo desesperadamente. Escrever para você é inspirar e expirar: é inspirar e esperar: é inspirar e suspirar: é respirar: é preencher o meu mundo com o que a vida me deu de mais improvável, precioso e vital: a possibilidade de um dia viver e morrer nos seus braços infinitos: todas as noites.

No comments: