Tuesday, December 19, 2006

Ela por ele

Ali parada: ela contemplava a luz do dia como quem contemplaria a mesma luz do mesmo dia se estivesse ali parado como ela.

E ela desfazia e refazia os mesmos gestos e gastava os mesmos sorrisos à toa. Se é que se pode gastar um sorriso assim. E ela conversava quase só, quase sóbria com ela mesma e discursava loucamente sobre as noites em que alucinava e delirava e dava e dava e andava e parava e duvidava o quanto fosse capaz de dar. E ameaçava não dar mais: deu o que falar. Virou manchete, foi pro jornal!E ela cutucava os seus instintos e os seus impulsos por precaução pois ela não queria nem nunca quis ser dependente de algo tão primórdio quanto: o instinto e o impulso. E ela cultuava a inteligência de uma forma tão brilhante, de uma forma jamais vista por aqui; pois Aqui não ser inteligente é um privilégio. E ela cometia erros tão humanos e se orgulhava de ser tão desumana ao reprimir seus pensamentos mais eróticos no meio de um jantar de negócios onde se negociava o futuro e o passado de uma provável situação presente da Humanidade. O resultado mostra o quão o ser humano é vulnerável: basta uma minúscula idéia contrária para contrariá-lo imensamente.

Agitada: ela contemplava o céu escuro como quem contemplaria o mesmo céu, mesmo sem luz, se estivesse agitado como ela. E ela ia embora. E ela vai embora,mas não antes de sonhar sozinha o sonho de um dia se multiplicar.

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